Princípio da Reserva Legal: entenda os principais fundamentos

princípio da reserva legal

O princípio da reserva legal está previsto no artigo 5°, inciso XXXIX, da Constituição Federal e no artigo 1° do Código Penal (que possui o mesmo texto abaixo descrito):

Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal

Podemos chamar ainda de princípio da estrita legalidade com origem na Magna Carta de 1215, de João Sem Terra. Ou seja, a lei, e somente a lei, é a fonte imediata do direito penal, de modo que só ela pode criar crimes e determinar as respectivas penas. E o motivo disso é, justamente, evitar os arbítrios do Estado, pois, era extremamente comum os imperadores absolutistas determinarem penas por crimes que nem sequer eram previstos.

Para evitar esses abusos, o tipo penal e sua respectiva penalidade devem ser descritos na norma.

Como exposto acima, o princípio tem alguns fundamentos para sua criação. Logo, a lei deve descrever com a maior precisão possível o conteúdo mínimo da conduta criminosa.

Por outro lado, tem-se também um fundamento político, uma vez que se busca evitar o arbítrio do Estado. Ou seja, cria uma espécie de “blindagem” em favor do cidadão, que saberá porque está sendo processado e quais podem ser as penalidades a ele aplicada caso pratique a conduta tipificada.

Em contrapartida, o que não for proibido por lei, o cidadão pode sim agir como bem entender, sem receio que sofra determinada punição (óbvio, que sem ferir preceitos constitucionais mínimos).

Nesse sentido político, podemos fazer uma referência com o surgimento do direito penal e sua codificação expressa como um direito de primeira geração, ao proteger, justamente, o cidadão desse arbítrio estatal.

O próprio Supremo Tribunal Federal (STF) diz que existe um fundamento democrático no princípio da reserva legal, pois este, estabelece que o povo determina quais condutas são crimes e, consequentemente, quais são suas penas.

É de extrema importante diferenciarmos esses dois princípios. Mas, antes de partirmos para a distinção, é relevante destacar que alguns autores tratam esses princípios como sinônimos, enquanto que outros colocam o princípio da legalidade como espécie do princípio da reserva legal. Independente da posição, é interessante saber as diferenças entre esses princípios. Quanto à reserva legal, já estudamos seu conceito acima. Já com relação ao princípio da legalidade, possui disposição legal no inciso II do artigo 5° da Constituição Federal:

Art. 5°. […] II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

Note que o princípio da legalidade possui um aspecto mais amplo que o da reserva legal. Quando cita a palavra “lei”, a descreve em sentido amplo, ou seja, admite qualquer uma das espécies normativas prevista no artigo 59 da Constituição:

Art. 59. O processo legislativo compreende a elaboração de:

I – emendas à Constituição;

II – leis complementares;

III – leis ordinárias;

IV – leis delegadas;

V – medidas provisórias;

VI – decretos legislativos;

VII – resoluções.

Portanto, um decreto de uma prefeitura proibindo a entrada de homens em determinado recinto governamental sem calça comprida é lei para efeitos do inciso II, artigo 5° da Constituição Federal. Porém, para fins penais, a palavra “lei” descrita no inciso XXXIX do artigo 5°, CF/88, traz um sentido mais estrito, ou seja, uma lei formada conforme as exigências do processo legislativo.

Além disso, é importante destacar também, que a lei deve ser elaborada privativamente pela União, podendo, de forma excepcional, ser realizada por estados-membros:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

I – direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho; […]

Parágrafo único. Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo.

Normas penais em branco, crimes culposos e tipos penais

O fato da reserva legal exigir que o conteúdo normativo seja taxativo não quer dizer que ele deve ser total. Por isso que se diz, no fundamento jurídico, que deve haver descrição da conduta mínima.

A primeira razão para isso é que o legislador ficaria “engessado” descrevendo de forma detalhada cada tipo e respectivamente a pena. A segunda razão é que as normas penais em branco, crimes culposos e tipos abertos não seriam possíveis. Imagine a seguinte situação:

O legislador tem que colocar na lei cada substância entorpecente ilícita e ter que atualizar esse rol a cada vez que uma nova substância surge. A criação em si das leis, é um ato demorado, com várias burocracias a serem observadas. Se coubesse ao legislador a atividade de descrever minuciosamente cada conduta, seria impossível a criação de tipos abertos e normas penais em branco, bem como explicar cada conduta que resultaria em crime culposo.

Medidas Provisórias

Quanto às medidas provisórias sobre o direito penal, é necessário ler o artigo 62, §1°, inciso I, item “b”, da Constituição Federal:

Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.

§ 1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria:

I – relativa a: […]

b) direito penal, processual penal e processual civil;

Ou seja, a Constituição proíbe a edição de medidas provisórias que tratam sobre direito penal. Apesar disso, o Poder Executivo Federal já editou medidas provisórias que tratam de matéria penal. Um exemplo é o próprio estatuto do desarmamento.

Esse estatuto estabeleceu um prazo para que houvesse a entrega de armas ilegais às autoridades, extinguindo a punibilidade desses possuidores. Ao passar o prazo inicial estabelecido, houve a sua prorrogação por meio de medida provisória. Por outro lado, a questão da validade da medida chegou ao Supremo Tribunal Federal, decidindo que não houve ilegalidade no ato por ser mais favorável.

Além disso, temos uma segunda posição na doutrina, que vai contra o entendimento da Corte Suprema. Para esses doutrinadores, a Constituição Federal é clara em vedar medidas provisórias sobre matéria penal, sejam elas favoráveis ou não aos réus.

Sobre o Autor

Césary Matheus
Césary Matheus

Acadêmico de direito, redator e fundador do Blog Destrinchando o Direito.

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