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Crime de aborto: espécies e majorantes (arts. 124 a 128 CP)

O crime de aborto é palco de inúmeros debates na sociedade. Alguns a favor, outros contra, outros preferem nem se posicionar. Mas, esse não é o objetivo deste artigo, embora pertinente. A seguir vamos nos aprofundar sobre o crime de aborto presente dos artigos 124 ao 128 do nosso Código Penal e entender todas as suas peculiaridades. Vamos nessa!

Conceito

O aborto consiste na interrupção da gravidez, com a morte do feto ou fruto da concepção. Ou seja, é considerado início da gravidez a fecundação, e para a legislação vigente, ocorrerá o aborto em qualquer fase da evolução fetal.

Com o início do trabalho de parto (natural ou por cirurgia) haverá homicídio ou infanticídio, a depender do sujeito ativo.

Indo agora para uma classificação mais minuciosa do direito penal, entendemos que o objeto jurídico do crime de aborto é a vida humana, enquanto que o objeto material é o feto (em ambiente intrauterino).

Quanto ao meio de execução, é sabido que pode ser utilizado vários meios para a consumação, sendo classificado como um crime de forma livre.

ESPÉCIES DE ABORTO

Iremos ver agora algumas espécies de aborto com alguns exemplos para facilitar o entendimento.

Aborto criminoso

Trata-se da interrupção dolosa da gravidez. Tratado dos artigos 124 a 127 do Código Penal

No art. 124 do CP tem-se o aborto provocado pela própria gestante (autoaborto) ou com seu consentimento. São, portanto, duas condutas em que a própria gestante interrompe sua gravidez, provocando a morte do feto.

Nessa modalidade, tem-se crime de mão própria, uma vez que somente a gestante poderá praticar. Nesse caso, admite a participação, em atividades acessórias, a exemplo do instigar, induzir ou auxiliar.

Se o terceiro pratica atos executórios do aborto, responderá pela figura do art. 126 do CP, uma vez que essa hipótese é uma exceção à teoria unitária ou monista quanto ao concurso de agentes (art. 29 do CP). O tipo do art. 124 não admite coautoria.

Exemplo: Um casal de namorados que engravida e decide pelo aborto. O rapaz que leva a namorada à clínica clandestina, contrata e paga pelos serviços, incide na figura do art. 126 do CP, ao passo que a mulher, consentindo com a prática abortiva, incorre no crime previsto no art. 124 do CP.

Aborto sem o consentimento da gestante

O art. 125 do CP contempla o aborto sem o consentimento da gestante, apenado de forma mais grave, com reclusão de 3 (três) a 10 (dez) anos. Conforme anteriormente explicado, se houver consentimento, a figura será a do art. 124 do CP.

Para a tipificação da conduta, não é preciso o emprego de violência, grave ameaça ou fraude. É suficiente que a gestante desconheça que nela está sendo praticado o aborto. Por sua vez, no art. 126 do CP pune-se a conduta do terceiro que provoca aborto com o consentimento da gestante.

Ou seja, falamos aqui da exceção à teoria monista quanto ao concurso de agentes, adotada como regra pelo Código Penal, já que o terceiro não será coautor do crime estabelecido no art. 124 do CP. Portanto, aqui é aplicado a teoria pluralista ou da cumplicidade do delito distinto.

Importa destacar que o aborto consentido (art. 124) e o aborto consensual (art. 126) são crimes de concurso necessário, pois exigem a presença de duas pessoas, no mínimo.

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Aborto legal ou permitido

Realizado de forma voluntária e com amparo legal, conforme previsão do art. 128 do CP. Há duas hipóteses para a exclusão de ilicitude, que são:

a) Se não há outro meio de salvar a vida da gestante, ou seja, é o chamado aborto necessário ou terapêutico, previsto no inciso I.

b) No caso de gravidez resultante de estupro, ou seja, trata-se do aborto humanitário, sentimental, ético ou piedoso, elencado no inciso II.

Nesse caso não há uma limitação temporal para o aborto. A prova da ocorrência do estupro, bem como o consentimento da gestante devem ser cabais.

Elemento subjetivo

O crime de aborto, em todas as suas formas, é praticado dolosamente. Ou seja, não há previsão de aborto culposo, restando, nesse caso, eventual reparação de danos na esfera cível. Lembrando que o dolo pode ser direto ou eventual.

O indivíduo que mata uma mulher, sabendo da gravidez, responde, em concurso formal, pelos crimes de homicídio e aborto, sendo pelo menos, dolo eventual.

Por outro lado, se o agente tinha a intenção de lesionar a mulher, cuja gravidez era nítida, e sobrevém o aborto, o crime será de lesão corporal gravíssima, nos termos do art. 129, § 2º, inc. V, do CP.

É possível a tentativa?

O crime é material, exigindo-se a morte do feto ou embrião para a consumação do delito. Será possível, assim, a tentativa, desde que, utilizados meios idôneos e eficazes, a morte do feto não sobrevenha por circunstâncias alheias à vontade do agente. A hipótese é de crime impossível (art. 17 do CP) quando se realiza manobra abortiva e o feto já estava morto.

A ação penal, assim como em todos os demais crimes contra a vida, é pública incondicionada.

MAJORANTES NO ABORTO (ART. 127)

O dispositivo prevê que as penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de 1/3 (um terço), se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave.

Além disso, são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, sobrevém a morte. Note a impropriedade técnica do legislador, ao utilizar a frase “formas qualificadas”, ou seja, o dispositivo traz causas de aumento de pena, que incidem na terceira fase da dosimetria e não formas qualificadas.

O que diz o STF sobre o aborto

Além das hipóteses legalmente previstas de aborto permitido, é necessário destacar a exceção criada pela jurisprudência do STF, no julgamento da ADPF 54/DF.

Conforme decidiu a Suprema Corte, a interrupção da gravidez de feto anencéfalo é conduta atípica. Assim, por força de interpretação jurisprudencial, realizar aborto de feto com anencefalia não é crime. Uma vez confirmado o diagnóstico, bem como a irreversibilidade da situação, não é necessário a prévia autorização judicial para a interrupção voluntária da gravidez.

Note que a decisão tomada na ADPF 54/DF, restringe-se aos casos de anencefalia. Ou seja, é certo que existem outras doenças e síndromes graves, incapacitantes da sobrevida fora do útero materno. Mas, para esses outros casos, é necessária a prévia autorização judicial para a interrupção da gravidez.

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Indicações de leitura:

  • Direito Penal – Parte Especial – Cleber Masson – CLIQUE AQUI
  • Código Penal Comentado – NUCCI – CLIQUE AQUI
  • Dos Delitos e das Penas – Cesare Beccaria – CLIQUE AQUI

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