Serviços públicos no Direito Administrativo: conceito, classificação, delegação e exemplos práticos

serviços públicos

O estudo dos serviços públicos ocupa papel central no Direito Administrativo brasileiro. Essenciais para a efetivação dos direitos fundamentais e para a concretização do interesse público, os serviços públicos representam um dos instrumentos pelos quais o Estado assegura à coletividade condições dignas de vida e promove o desenvolvimento social.

No contexto dos concursos públicos e dos cursos de graduação em Direito, o domínio deste tema é indispensável, não apenas pela recorrência em provas, mas também pela sua relevância prática no funcionamento da Administração Pública. A partir da Constituição Federal e de leis infraconstitucionais, como a Lei nº 8.987/1995 (Lei de Concessões e Permissões de Serviços Públicos) e a Lei nº 11.079/2004 (Lei das Parcerias Público-Privadas), delineia-se o regime jurídico que rege a prestação, a delegação, a fiscalização e a extinção dos serviços públicos no Brasil.

Este artigo tem por objetivo apresentar, de forma sistematizada e detalhada, os principais aspectos relativos aos serviços públicos: seu conceito, classificação, formas de prestação, modalidades de delegação, direitos e deveres dos usuários, convênios, consórcios e parcerias público-privadas.

1 – Conceito de serviços públicos

Os serviços públicos constituem uma das principais manifestações da atividade administrativa do Estado. São definidos como atividades desempenhadas diretamente pelo Poder Público ou por seus delegatários, destinadas a satisfazer necessidades essenciais da coletividade ou a proporcionar utilidades de interesse público.

Celso Antônio Bandeira de Mello conceitua serviço público como “toda atividade material que a lei atribui ao Estado para desempenhá-la diretamente ou por meio de seus delegatários, sob regime de direito público, com vistas à satisfação de necessidades coletivas”.

A Constituição Federal prevê, em diversos dispositivos, a competência e o dever do Estado na prestação de serviços públicos (por exemplo, art. 21, art. 23 e art. 30), demonstrando a sua essencialidade para a consecução do bem comum.

A prestação desses serviços pode ocorrer:

  • Diretamente pelo Estado, por meio de órgãos e entidades da Administração direta;
  • De forma descentralizada, por entidades da administração indireta (autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista); ou ainda
  • Por delegação a particulares, mediante concessão, permissão ou autorização, conforme disciplinado na Lei nº 8.987/1995.

2 – Classificação dos serviços públicos

A doutrina e a legislação classificam os serviços públicos em diversas categorias. Uma das classificações mais relevantes para fins jurídicos é a que os divide em serviços gerais (uti universi) e serviços individuais (uti singuli).

a) Serviços gerais (uti universi)

São aqueles prestados de forma indivisível à coletividade em geral, sem possibilidade de identificar beneficiários específicos. Por sua natureza, não há como mensurar o consumo individual, sendo financiados por meio da arrecadação de impostos.
Exemplos clássicos incluem a segurança pública, a iluminação pública e o saneamento básico.

Além disso, alguns desses serviços são considerados indelegáveis, como a própria segurança pública, que deve ser prestada exclusivamente pelo Estado.

b) Serviços individuais (uti singuli)

Por outro lado, os serviços uti singuli permitem a identificação do usuário e a mensuração do consumo individual. Por essa razão, são remunerados por meio de tarifas públicas (preços públicos).

São exemplos: abastecimento de água, fornecimento de energia elétrica e transporte coletivo. Alguns desses serviços podem ser delegados a particulares, nos termos do art. 175 da Constituição Federal, por meio de concessão, permissão ou autorização.

3 – Serviços públicos delegados

A delegação ocorre quando a Administração Pública transfere a execução de determinado serviço a um particular. Nesses casos, o destinatário final dos serviços continua sendo a sociedade, e não a Administração.

A Lei nº 8.987/1995 disciplina a delegação dos serviços públicos, estabelecendo que esta pode ocorrer nas formas de concessão, permissão ou autorização, mediante prévia licitação, ressalvadas as hipóteses legais.

Importa destacar que, mesmo delegada a execução, a titularidade do serviço permanece com o Estado, que conserva o dever de fiscalizar e garantir a sua adequada prestação.

4 – Serviço adequado

A noção de serviço adequado é um dos pilares do regime jurídico dos serviços públicos. Segundo o art. 6º da Lei nº 8.987/1995:

“Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.”

Isso significa que os serviços públicos devem ser contínuos, seguros e atualizados tecnologicamente, prestados com eficiência e cortesia, atendendo às necessidades dos usuários a preços módicos.

Quando a tarifa se revela insuficiente para custear a prestação do serviço, a Administração Pública pode subsidiar parte dos custos.

Ao delegar a execução a um concessionário, o Estado transfere também a obrigação de garantir a qualidade do serviço, sob fiscalização permanente do poder concedente e das agências reguladoras, que fixam padrões técnicos e operacionais em suas áreas de atuação.

5 – Direitos e obrigações dos usuários

O usuário, termo técnico para designar o destinatário dos serviços públicos, possui direitos e deveres específicos previstos no art. 7º da Lei nº 8.987/1995.

Direitos dos usuários:

  • Receber serviço adequado, nos termos do art. 6º;
  • Reclamar contra a má prestação do serviço;
  • Obter informações junto ao poder concedente e à concessionária, desde que não protegidas por sigilo;
  • Escolher entre diferentes prestadores, quando houver concorrência no mercado, sendo dever do Poder Público evitar monopólios.

Obrigações dos usuários:

  • Comunicar às autoridades competentes irregularidades ou ilícitos praticados pela concessionária;
  • Colaborar com a conservação e manutenção de bens públicos ou privados utilizados na prestação do serviço.

Além disso, a Lei nº 13.460/2017 trouxe importantes avanços ao tratar da participação, proteção e defesa dos direitos dos usuários dos serviços públicos, reforçando a necessidade de transparência e participação social.

6 – Modalidades de delegação: concessão, permissão e autorização

O art. 2º da Lei nº 8.987/1995 define as modalidades pelas quais os serviços públicos podem ser delegados a particulares:

a) Concessão

É a transferência da prestação do serviço a pessoa jurídica ou consórcio de empresas, mediante licitação na modalidade concorrência e contrato administrativo por prazo determinado.

Características principais:

  • Licitação obrigatória;
  • Contrato formal e típico;
  • Risco da atividade assumido integralmente pelo concessionário;
  • Remuneração geralmente por tarifas pagas pelos usuários.

Exemplos: concessão de rodovias, transporte coletivo urbano, fornecimento de energia elétrica.

b) Permissão

A permissão é uma forma precária de delegação, com prazo indeterminado, podendo ser revogada a qualquer tempo pelo poder concedente. O delegatário pode ser pessoa física ou jurídica.

Difere da concessão principalmente pela natureza mais flexível e revogável do vínculo. Serviços como transporte suplementar por micro-ônibus ou táxi são comumente prestados por permissão.

c) Autorização

Embora não expressamente definida na Lei nº 8.987/1995, a autorização é reconhecida pela doutrina como a forma mais simples e precária de delegação.

Geralmente utilizada para serviços de menor relevância social, em que o interesse do autorizatário prevalece. Exemplo: autorização para exploração de bancas de jornal ou feiras públicas.

7 – Extinção da concessão

As concessões de serviços públicos podem ser extintas por diversas razões, como o término do prazo contratual, a anulação por ilegalidade ou a rescisão por descumprimento contratual.

Duas hipóteses merecem destaque:

  • Encampação: retomada do serviço pelo poder concedente por razões de interesse público, sem que haja culpa do concessionário.
  • Caducidade: extinção punitiva do contrato por descumprimento imputável ao concessionário.

⚠ ️ Atenção: não se deve confundir a caducidade da concessão com a caducidade do ato administrativo. Nesta última, a extinção decorre da superveniência de norma incompatível com a manutenção do ato.

8 – Convênios e consórcios

Tanto convênios quanto consórcios encontram previsão constitucional e representam formas de cooperação entre entes públicos ou entre estes e entidades sem fins lucrativos.

Convênios

Conforme a doutrina, convênio é um acordo firmado entre entes públicos, ou entre ente público e entidade sem fins lucrativos, com vistas à consecução de objetivos comuns e de interesse público, sem intuito lucrativo.

Podem envolver a transferência de recursos financeiros e têm como objeto a execução de programas, projetos, atividades ou obras. Sua formalização exige plano de trabalho, chamamento público e está sujeita à fiscalização pelos Tribunais de Contas.

Consórcios públicos

Previstos na Lei nº 11.107/2005, os consórcios são associações entre entes federativos (União, Estados, DF e Municípios) para prestação de serviços ou execução de ações conjuntas.

Podem ser:

  • Horizontais – entre entes de mesmo nível federativo (Município + Município);
  • Verticais – entre entes de níveis diferentes (Município + Estado + União).

A constituição de um consórcio exige a criação de uma nova pessoa jurídica, que pode ser de direito público (integra a administração indireta) ou de direito privado (associação ou fundação).

Documentos essenciais:

  • Protocolo de intenções, ratificado pelos partícipes;
  • Contrato de rateio, que define as obrigações financeiras;
  • Contrato de programa, que estabelece compromissos operacionais.

9 – Parcerias público-privadas (PPPs)

A Lei nº 11.079/2004 introduziu no ordenamento jurídico brasileiro as Parcerias Público-Privadas (PPPs), modalidade especial de concessão voltada a projetos em que o usuário final é a própria Administração Pública ou em que há necessidade de patrocínio estatal para viabilizar o investimento privado.

Nas PPPs:

  • O risco da atividade é compartilhado entre o parceiro privado e o Poder Público;
  • Podem ser estabelecidos pagamentos variáveis vinculados ao cumprimento de metas e ao desempenho;
  • São previstas garantias de retorno financeiro e fundos garantidores para mitigar riscos.

A principal distinção em relação às concessões comuns é que, nas PPPs, o projeto básico nem sempre é elaborado exclusivamente pelo Poder Público, e a remuneração do parceiro privado pode incluir recursos públicos, além das tarifas pagas pelos usuários.

Exemplos: concessões de sistemas prisionais, projetos de infraestrutura rodoviária e saneamento de grande porte.

Conclusão

Os serviços públicos constituem instrumentos essenciais para a efetivação dos direitos fundamentais e para a concretização dos objetivos do Estado. Sua prestação, seja direta ou delegada, exige observância a princípios como continuidade, eficiência, segurança, atualidade e modicidade, conforme previsto no art. 6º da Lei nº 8.987/1995.

O estudo aprofundado de sua classificação, formas de delegação, direitos e deveres dos usuários, modalidades contratuais e formas de cooperação entre entes públicos revela a complexidade e a importância desse instituto no âmbito do Direito Administrativo.

Para o concurseiro, dominar esse tema não é apenas uma exigência acadêmica, mas também um diferencial competitivo, dada sua presença constante em provas objetivas e discursivas. A compreensão sólida dos serviços públicos — desde sua conceituação até as parcerias público-privadas — é, portanto, passo fundamental na trajetória rumo à aprovação e ao exercício eficiente das funções públicas.

💡 Dica para concursos: atenção especial aos dispositivos da Lei nº 8.987/1995 e da Lei nº 11.079/2004, pois são frequentemente cobrados em provas objetivas e discursivas, além de constituírem leitura obrigatória para uma compreensão completa do tema.

Sobre o Autor

Césary Matheus
Césary Matheus

Advogado, pós graduando em direito previdenciário e fundador do Blog Destrinchando o Direito.

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