Crime de peculato (arts. 312 e 313 do Código Penal): conceito, tipos e peculiaridades
O crime de peculato possui previsão legal nos artigos 312 e 313 do Código Penal. O primeiro descreve o delito em sua forma básica, enquanto que o segundo dispositivo prevê o peculato por meio de erro de outra pessoa.
Porém, essa não é a única peculiaridade sobre o crime de peculato. Então continue a leitura para compreender todos os detalhes sobre esse tipo penal. Bons estudos!
O que é crime de peculato?
O art. 312 do Código Penal prevê o seguinte texto:
Art. 312. Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio.
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
§ 1º Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.
Quem comete o crime de peculato?
Após a leitura do art. 312 do CP, a resposta fica fácil: o funcionário público. Ou seja, é ele que desvia ou se apropria de bens públicos ou particulares em virtude do seu cargo. Trata-se, portanto, de um CRIME PRÓPRIO.
O particular, nesse delito, pode atuar como coautor ou participante do crime, uma vez que as características exigidas pelo tipo penal se aplicam a ele, conforme previsão do próprio art. 30 do CP:
Art. 30 – Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime.
Quem é considerado funcionário público?
O artigo 327 do Código Penal conceitua funcionário público, vejamos:
Art. 327 – Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.
§ 1º – Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública.
Quem é a vítima?
O Estado, especificamente o órgão da Administração Pública responsável pelo bem que foi apropriado, e a sociedade, que é afetada em segundo plano pelo dano econômico causado ao erário.
Quais os tipos de peculato?
1 – Peculato-apropriação
O peculato por apropriação ocorre quando um agente, em razão de seu cargo, se apropria de bens, valores ou dinheiro pertencentes ao poder público. O núcleo do tipo é “apropriar-se”.
Um exemplo típico dessa modalidade é quando um servidor público utiliza um veículo oficial, destinado a atividades do trabalho, para fins pessoais, como transportar amigos ou familiares.
Nesse caso, o servidor está se apropriando indevidamente de um bem público, desviando sua finalidade original e causando dano ao erário.
2 – Peculato-desvio
No peculato desvio, a conduta do agente é fundamental para a caracterização do crime. O termo “desviar” indica que o servidor público modifica a destinação original de bens ou valores.
Exemplo: se um servidor utiliza recursos que deveriam ser usados para a compra de livros didáticos e, ao invés disso, decide empregá-los em uma festa para amigos, ele está desviando esses recursos, comprometendo a finalidade a que se destinavam.
Destaca-se que o benefício resultante do desvio não precisa ser exclusivamente econômico, podendo envolver vantagens sociais ou pessoais.
3 – Peculato-furto
O peculato furto é uma forma de peculato impróprio, na qual um funcionário público furta ou subtrai bens ou valores que não estavam sob sua posse, mas cujo acesso foi facilitado pela sua condição de servidor público.
Suponha que um funcionário da Secretaria da Fazenda de uma Prefeitura, por descuido, deixe um montante de dinheiro em caixa sem utilizar os métodos de segurança habituais.
Um colega, também servidor público, aproveitando-se do acesso que tem à repartição, subtrai uma parte dos valores disponíveis. Nesse caso, esse último estaria cometendo peculato-furto.
4 – Peculato culposo
O conceito de peculato culposo (art. 312, § 2°), ocorre quando o agente, por negligência, permite que outra pessoa cometa o crime, ao não zelar adequadamente pelo bem público, valor ou dinheiro sob sua responsabilidade. Vejamos o que prevê o dispositivo mencionado:
§ 2º – Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem:
Pena – detenção, de três meses a um ano.
§ 3º – No caso do parágrafo anterior, a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta.
5 – Peculato mediante erro de outrem (peculato-estelionato)
Esta espécie de peculato ocorre quando, em decorrência do erro de outra pessoa, o funcionário público acaba se apropriando ou desviando um bem público.
Nesse caso, o erro pode ser praticado por alguém que não ocupa cargo público. Conforme a letra da lei:
Art. 313 – Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem.
Diferente de outras formas de peculato, nesta situação, o funcionário público não deveria ter a posse do bem ou valor. Portanto, se ele colaborar para o erro de outra pessoa, caracteriza-se o crime de estelionato. Para contextualizar o leitor, vale relembrar a definição de estelionato conforme o Código Penal:
Art. 171 – Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento.
Por essa razão, o peculato mediante erro de outra pessoa também é conhecido como “peculato-estelionato”.
6 – Peculato eletrônico
Ao contrário dos demais tipos, o peculato eletrônico ou digital está previsto no Art. 313-A. De acordo com o dispositivo:
Art. 313-A. Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano […].
Assim como nas outras modalidades de peculato, também aqui o funcionário público é quem ocupa o polo ativo.
Quais as penas aplicadas no crime de peculato?
As penas para o crime de peculato variam de acordo com a modalidade praticada. Conforme previsto no Código Penal, temos:
- Peculato apropriação e desvio: reclusão de dois a doze anos e multa (Art. 312, caput);
- Peculato culposo: detenção de três meses a um ano (Art. 312, §2º);
- Peculato mediante erro de outrem, ou peculato-estelionato: reclusão de um a quatro anos e multa (Art. 313);
- Peculato eletrônico ou digital: reclusão de dois a doze anos e multa (Art. 313-A).
Diferença entre crime de peculato e corrupção passiva
- Peculato: é um crime praticado exclusivamente por funcionários públicos que se apropriam ou desviam bens ou valores públicos para benefício próprio ou de terceiros. Ele envolve a violação da confiança depositada no agente público, que, ao exercer sua função, tem acesso a recursos do Estado.
- Corrupção passiva: trata-se do ato de um funcionário público solicitar ou receber, direta ou indiretamente, vantagem indevida em razão de sua função. Este crime não se limita à apropriação de bens, mas envolve o recebimento de suborno ou propina em troca de favorecimento em decisões administrativas.
Diferença entre crime de peculato e apropriação indébita
A apropriação indébita e o peculato podem ser facilmente confundidos, uma vez que ambas as condutas tipificadas utilizam o mesmo verbo: apropriar.
A apropriação indébita ocorre quando o agente se apropria – agindo como se fosse o proprietário – de um bem móvel que está sob sua posse ou detenção.
Assim, qualquer pessoa física ou jurídica pode ser tanto o sujeito passivo quanto o ativo da apropriação.
Exemplo: Imagine que um funcionário recebe um carro de seu empregador para realizar atividades de trabalho e, em vez de utilizá-lo para essa finalidade, começa a agir como seu dono, vendendo peças do automóvel. Essa conduta exemplifica a apropriação indébita.
Por outro lado, o crime de peculato também envolve a apropriação de bens móveis, valores ou dinheiro. Contudo, ao contrário da apropriação indébita, somente funcionários públicos podem ser os agentes ativos nesse crime.
Dúvidas frequentes:
O que é crime de peculato?
Peculato é o crime praticado por um funcionário público que se apropria, desvia ou permite o desvio de bens ou valores públicos para benefício próprio ou de terceiros.
Qual o bem jurídico protegido no peculato?
O bem jurídico protegido é o patrimônio público e, indiretamente, a moralidade e probidade administrativa no uso de recursos e bens do Estado.
Quais são os tipos de peculato?
Os principais tipos de peculato são:
- Peculato apropriação ou desvio (Art. 312);
- Peculato culposo (Art. 312, §2º);
- Peculato mediante erro de outrem ou peculato-estelionato (Art. 313);
- Peculato eletrônico ou digital (Art. 313-A).
Quem comete crime de peculato?
O crime de peculato é cometido exclusivamente por funcionários públicos, ou por aqueles que, mesmo temporariamente, estejam incumbidos da administração, guarda ou manuseio de bens públicos.
Quais os artigos do crime de peculato?
O crime de peculato está previsto nos seguintes artigos do Código Penal:
- Art. 312 (peculato apropriação, desvio e culposo);
- Art. 313 (peculato mediante erro de outrem);
- Art. 313-A (peculato eletrônico ou digital).
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