Tutela provisória: conceito, tipos e exemplos
A resposta do Poder Judiciário a um pedido formulado pelo autor não é imediata. Mas em determinadas situações não é necessário aguardar o trânsito em julgado, sendo concedida a famosa tutela provisória. Ou seja, trata-se de uma decisão logo no início do processo (liminarmente).
Essa tutela provisória é o gênero, dividindo-se em duas espécies: tutela de urgência e tutela de evidência. Essa primeira (tutela de urgência), ainda é subdividida em cautelar e antecipada (art. 294, parágrafo único do CPC).
Continue a leitura para entender de maneira detalhada essas espécies.
Espécies da tutela provisória de urgência
Como dito, a tutela provisória de urgência pode ser concedida por antecipação ou por meio de cautelar. Do ponto de vista formal, ambas são pleiteadas da mesma forma: ou durante o processo de conhecimento que já tramita (incidentalmente) ou mesmo antes de se debater o pedido principal (tutela de urgência antecedente).
É possível, ainda, realizar o pedido junto com o principal, na mesma petição inicial.
Se a tutela de urgência for pleiteada de forma antecedente, há necessidade de se aditar a petição inicial, para se formular o pedido principal, sob pena de extinção.
Diferença entre antecipação de tutela e cautelar
A finalidade da cautelar é resguardar o pedido principal, evitando assim o perecimento do direito.
Já a finalidade da antecipação de tutela é, desde logo, antecipar os efeitos de uma futura decisão de mérito (caráter satisfativo).
Fungibilidade entre as tutelas de urgência?
O juiz pode receber um pedido cautelar como se fosse tutela antecipada?
No CPC/73, a jurisprudência entendia que a fungibilidade era de mão dupla (ou seja, fungibilidade nos dois sentidos). No CPC atual, o tema ainda está em aberto. De qualquer forma, é certo que apenas a tutela antecipada pode ser estabilizada, e não o pedido cautelar (art. 304).
Por essa razão, se a parte pleitear uma tutela antecipada e o juiz a receber como tutela cautelar, não será possível sua estabilização.
Da tutela de urgência e seus requisitos
São requisitos da tutela de urgência:
- Elementos que evidenciem a probabilidade do direito;
- Perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (CPC, art. 300).
Para deferir a tutela de urgência, o juiz poderá, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la (CPC, art. 300, § 1º). Ou seja, ficará a critério do juiz, a depender do caso, determinar a prestação de caução ou não.
Concessão da tutela de urgência
A concessão da tutela de urgência poderá se verificar liminarmente ou após audiência de justificação prévia, quando se poderá fazer prova dos requisitos para sua concessão (CPC, art. 300, § 2º).
Essa audiência também ficará a critério do magistrado.
Vedações a tutela de urgência
Caso haja perigo de irreversibilidade (art. 300, §3° do CPC) não será possível a tutela antecipada. Ou seja, não se concede a tutela de urgência antecipada se a situação não puder voltar ao que era antes (ao status quo ante).
Do procedimento da tutela antecipada antecedente
A tutela antecipada antecedente vem prevista para os casos em que a urgência for anterior ou contemporânea (conjunta) à propositura da ação.
Nessas hipóteses, a petição inicial pode limitar-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (CPC, art. 303).
1 – Recolhimento de Custas
Sendo essa a escolha do autor, haverá recolhimento de custas, e o valor da causa deverá levar em consideração o pedido de tutela final, e não apenas o valor relativo à antecipação de tutela (CPC, art. 303, § 4º).
2 – Aditamento da Petição Inicial
Ou seja, pode-se pedir somente a tutela antecipada, indicando na petição qual será o pedido principal, que nesse caso não mais será uma “ação principal”, pois o pedido será elaborado posteriormente, nos mesmos autos.
3 – Prazo para Aditamento
Se concedida a tutela antecipada antecedente, o autor deverá aditar a petição inicial para complementar sua argumentação, juntar novos documentos e confirmar o pedido de tutela final, em 15 dias ou em outro prazo maior que o juiz fixar (CPC, art. 303, § 1º, I).
Feito o aditamento, o réu será citado para comparecer à audiência de conciliação ou de mediação (CPC, art. 303, § 1º, II). Caso não haja acordo, somente aí haverá o início do prazo para contestação (CPC, art. 303, § 1º, III).
4 – Extinção do Processo
Se o autor não aditar a petição inicial para elaborar o pedido principal, haverá a extinção do processo sem resolução do mérito (CPC, art. 303, § 2º). Se a tutela antecipada for indeferida, o juiz determinará a emenda da inicial, em 5 dias, sob pena de extinção do processo sem resolução do mérito (CPC, art. 303, § 6º).
ATENÇÃO: a inovação do CPC é a previsão de estabilização da tutela antecipada: a tutela antecipada concedida se tornará estável se da decisão que a conceder não for interposto recurso (CPC, art. 304).
5 – Estabilização da Tutela Antecipada
A doutrina debate se a menção a “recurso” deve ser entendida como a utilização do agravo ou se seria possível interpretar que qualquer impugnação à decisão judicial concessiva da antecipação de tutela (inclusive a própria contestação) também poderia ser considerada.
Uma vez estabilizada a antecipação de tutela, o processo será extinto, e qualquer uma das partes poderá ingressar com novo processo judicial para revisar, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada, no prazo de até 2 anos a contar da ciência da decisão extintiva (CPC, art. 304, §§ 1º, 2º e 5º).
6 – Coisa Julgada
Dessa forma, caso não haja uma ação para afastar a estabilidade da tutela antecipada, estaríamos diante de coisa julgada? Pelo Código, não.
O Código de Processo Civil afirma que a decisão que concede a tutela não fará coisa julgada (CPC, art. 304, § 6º). O que ocorre é a estabilidade dos efeitos da tutela antecipada, a qual só será afastada por decisão proferida na demanda que busca alterá-la.
7 – Possibilidades de Ação
Uma possível interpretação é entender que, se o réu não recorrer da decisão que concede a tutela antecipada, o autor terá duas opções:
- Aditar a inicial, o que evitaria a estabilização da tutela antecipada e permitiria o prosseguimento do processo; ou
- Não aditar a inicial, hipótese em que não haveria a extinção, mas sim a estabilização da tutela antecipada. Nesse último caso, o autor poderia eventualmente ingressar com nova medida judicial para pleitear o pedido principal.
8 – Exemplo Prático
Imagine uma inscrição indevida em cadastro restritivo de crédito. A tutela provisória de urgência antecipada é requerida de forma antecedente, com o pedido limitado à exclusão do nome do cadastro restritivo, sendo que o pedido principal futuro seria a indenização por danos morais.
A tutela provisória antecipada é então deferida, determinando a exclusão do nome do cadastro restritivo de crédito. Nesse caso, verifica-se as seguintes possibilidades:
- O réu interpõe agravo e o autor não adita a inicial: não há estabilização da tutela provisória antecipada, e o processo será extinto sem resolução do mérito.
- O réu interpõe agravo e o autor adita a inicial, pleiteando danos morais: não há estabilização da tutela antecipada, e o processo prosseguirá.
- O réu não interpõe agravo e o autor não adita a inicial: ocorre a estabilização da tutela antecipada (no sentido de que a inscrição é indevida) e a extinção do processo com resolução de mérito, com a procedência do pedido de tutela antecipada. Se o autor desejar pleitear danos morais, poderá fazê-lo por meio de uma nova demanda.
A tutela antecipada conservará seus efeitos enquanto não for revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito (CPC, art. 304, § 3º).
Do procedimento da tutela cautelar antecedente
Nesse caso, a petição inicial deve indicar a lide e seu fundamento, uma exposição sumária do direito que se busca assegurar, além do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (CPC, art. 305).
Se o autor preferir, o pedido principal pode ser formulado juntamente com o pedido de tutela cautelar, conforme o art. 308, § 1º, do CPC. Isso segue o mesmo formato previsto para a tutela antecipada antecedente.
1 – Fungibilidade entre tutelas de urgência
Se o juiz entender que o pedido tem natureza antecipada, deverá aplicar o regramento da tutela antecipada (CPC, art. 305, parágrafo único). Isso reflete a fungibilidade entre as tutelas de urgência.
No entanto, não há previsão específica no Código para o caminho inverso, ou seja, para que o juiz receba uma tutela antecipada como cautelar.
Embora não exista previsão legal para essa inversão, é necessário observar como a jurisprudência se posicionará sobre o tema. No sistema anterior, também havia previsão apenas para a fungibilidade da tutela antecipada para a cautelar, mas a jurisprudência acabou admitindo a fungibilidade em ambos os sentidos.
De qualquer forma, a estabilização ocorre apenas na tutela antecipada, que tem natureza satisfativa. A tutela cautelar, que visa apenas resguardar o direito em disputa, não pode se estabilizar. Seria incongruente falar em estabilização de algo acautelatório.
2 – Citação e prazo para contestação
No caso da tutela cautelar antecedente, o réu será citado para contestar em 5 dias (CPC, art. 306), um prazo curto e fora da regra geral do CPC. Se o réu não apresentar contestação, haverá revelia, com presunção de veracidade dos fatos narrados. O juiz deverá então decidir no prazo de 5 dias (CPC, art. 307).
Se houver contestação, a demanda seguirá pelo procedimento comum do processo de conhecimento (CPC, art. 307, parágrafo único).
3 – Apresentação do pedido principal
Uma vez efetivada a tutela cautelar, o autor deverá formular o pedido principal no prazo de 30 dias. Esse pedido será apresentado nos mesmos autos em que o pedido cautelar foi deduzido (CPC, art. 308).
O complemento da demanda referente ao pedido principal não exigirá o pagamento de novas custas processuais (CPC, art. 308), e será possível aditar a causa de pedir (CPC, art. 308, caput e § 2º).
4 – Audiência de conciliação ou mediação
Após a apresentação do pedido principal, as partes serão intimadas para comparecer à audiência de conciliação ou mediação. Caso não haja acordo, o prazo para contestação começará a contar a partir desse momento (CPC, art. 308, §§ 3º e 4º).
5 – Cessação da eficácia da tutela cautelar antecedente
A eficácia da tutela cautelar antecedente cessa se ocorrer uma das seguintes situações (CPC, art. 309):
- Não for apresentado o pedido principal no prazo de 30 dias;
- A tutela cautelar não for efetivada em 30 dias;
- O pedido principal for julgado improcedente ou o processo for extinto sem resolução de mérito.
Nesses casos, só será possível formular um novo pedido se houver um novo fundamento, ou seja, uma nova causa de pedir.
Em regra, o indeferimento do pedido cautelar não impede a formulação do pedido principal. A exceção ocorre quando houver o reconhecimento de prescrição ou decadência durante a análise do pedido cautelar (CPC, art. 310).
Nessa situação, a coisa julgada do processo cautelar deverá ser observada no processo principal.
Da tutela da evidência
A tutela da evidência busca resguardar um direito evidente. Ou seja, é a tutela provisória que não depende de urgência.
A tutela da evidência pode ser concedida sem a necessidade de demonstrar perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. O Código prevê quatro situações em que isso é possível (art. 311):
- Quando houver abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório da parte (tutela da evidência penalizadora da má-fé);
- Quando as alegações de fato puderem ser comprovadas documentalmente, e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou súmula vinculante (tutela da evidência baseada em tese de tribunal superior);
- No caso de pedido reipersecutório, fundado em prova documental de contrato de depósito, podendo ser decretada a entrega do objeto custodiado com imposição de multa (tutela da evidência em contrato de depósito);
- Quando a petição inicial estiver instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, sem que o réu apresente prova capaz de gerar dúvida razoável (tutela da evidência com base em prova incontroversa).
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